terça-feira, 30 de junho de 2015

O bêbado


O bêbado é o mais forte
dos leões; até ao lado da morte é mais!

O bêbado é o mais belo 
dos modelos; até ao lado do zelo é mais!

O bêbado é o mais sábio
dos filósofos; até ao lado do lábio é mais!

O bêbado é o mais santo
dos sagrados; até ao lado do pranto é mais!

O bêbado é o mais cômico
dos humoristas; até ao lado do mico é mais!

O bêbado é o mais feito
dos corajosos; até ao lado do eleito é mais!

O bêbado é o mais rico
dos burgueses; até ao lado do cínico é mais!

O bêbado é o mais alto
dos soberanos; até ao lado do assalto é mais!

O bêbado é o mais bravo
dos selvagens; até ao lado do escravo é mais!

O bêbado é o mais fino
dos elegantes; até ao lado do grã-fino é mais!

O bêbado é o mais livre
dos poetas; até ao lado que o prive é mais!

O bêbado é o mais absoluto
dos deuses; até ao lado do luto é mais!

O bêbado é assim, é tudo...
Menos ele mesmo; até ao lado
do mudo ele é mais um absurdo, até ao lado
do surdo é mais!



domingo, 28 de junho de 2015

Sempre que possível


meus poucos amigos...
tão claros tão raros, meus caros!
tão caros em me servir as mãos
sempre que possível
deixam outras coisas mais
deixam outra coisa amais
que o impossível

:imagens en color en close
visões para o céu para o mar
recordações de fogo e de gelo
infinitos particulares para amar
desamar e para ser só ser perdão

ar sobre o ar que me faz pensar...

:os meus poucos amigos
sempre que possível ficam mais claros raros e tão caros
quando possivelmente pousam suas mãos
na minha mão.




EU



"                
                            mal

meu                                                  bem

                            É

meu                                                  mal
                           'EU'

bom                                                  meu

                            É

mau                                                  meu

                           bem                              "


   


Soneto


Quatro partes de mim

Da parte primeira de mim me levou
Ao campo de concentração num forte
Sonho à noite... Já ao lumiar deu sorte
Com sol! Mas me veio a treva e me acordou.

Da parte segunda me trouxe o corte
Pro pulso e perdi tudo aquilo que sou...
De meus sonhos, o único que restou
Foi a lembrança de mim quanto à morte.

E só por hoje, da parte terceira
De mim, o meu cadáver podre dorme
Aqui com os corvos... Chacal me cheira...

Já da minha quarta parte 'stou torto
Querendo a quinta que é em mim conforme
A luz do campo, a luz de um sonho morto!




Hai-Cai


Lua-cheia no céu
    Brilha ao mar como Narciso,
       Eu a vejo linda mais doce que o mel.



Se vejo logo desejo


A beleza de ver e rever
o sol nascer
me deixa besta igual ao cego
quando ouve o rouxinol
imaginando-o comendo ameixa...

A beleza de ver
o sol se pôr
me deixa às vezes triste
porquê me vem o luar...
que de tão lindo, penso imagino
mas não nego..

-Ó rouxinol sem canto
um pardal no bico do corvo
sem bico pra cantar!

O nêgo meigo na treva se queixa pelo descantar
tão sonhado pelo imaginário

( ? )
Que amanheça a beleza
dos cantares do nascer do sol!


Igualmente Igual


Já não sei se sou vice
ou se sou versa
tampouco sei se vi alice
dentro de minhas maravilhas
nas perdidas ilhas
com ela pouco siso muita conversa

Já não sei se sou ice
ou se sou berg
talvez sei que vi rose, ai se
é jack o burguês em amor e arte
dentro da arca maravilhada
na cilada de deus vindo do albergue!

Já não sei se sou contra
ou se sou o verso
nem tão sei se sei (se) se encontra
um só eu cá dentro de um verbo
sei que versejo e isto até vejo
mas nem tão mais disperso

Já não sei se sou bemol
ou se sou sustenido
tão pouco sei se há um rouxinol
fora de meu íntimo quase tímido
no entanto que haja som
para o coração quase falecido

Não sei se sou matéria irreal
ou matéria orgânica
já nem sei se sou alma ardente
ou se sou corpo quente leal
esperando outro igualzinho ao meu

-mas sei que não saberei da mecânica.





Hicaí de gala


Relógio derretido,
Na parede não o ouço
Se salva dor dalí.



Cinza


Na perda de minha linda
eu já rimei amor com dor... como todos!

amor, talvez se rima com dor
vida se rima com com color em cima com colar em cima
de toda flor com bolor

fui e minha linda se anima




sem cor sem clima...

com clima de cinzas e cinza de outono.




O gosto antigo do novo


boa noite, meus velhos bardos!
meus velhos senhores nocturnos
jovens há mais tempo que eu
boêmios cantores que os tempos
-já não trazem mais
deixe-me um trago um gole uma dose
de suas essências para um verso meu
deixem comigo 
o gosto amigo e antigo nos lábios trêmulos

Eu quero cantar ar

o gosto antigo de teus versos
de teus amores tuas dores mais fortes
eu sei que não terei não edificarei
mas boa noite, meus velhos poetas
d'estantes e soturnos solitários 

deixe-me instantes na boca
de um velho neopoeta noturno
que virá um dia que os saibam bem
que eu vos dirá igualmente como os sendo

um tanto tonto também
tento meu verbo girá em mim em vós
aqui para acolá do além
:me deixará comigo convosco, amigos!
o gosto de que há o novo
dentro d'estantes envolto ao pó

Eu quero cantar ar


Vininha & Bukowski